sexta-feira, 31 de julho de 2009

A PESCARIA FRUSTRADA

Arruma as traias mulher
fim de semana nós vamos pescar,
tenho tudo combinado
com o compadre Ademar.

Vamos levar também os meninos
pra não ficar preocupação,
bateremos anzol por três dias,
leva arroz, tempero e feijão!

Com a carne, não se preocupe
das águas nós vamos tirar
pescado fresco, da hora,
pra pinguinha acompanhar.

A comadre Ana, também vai
acompanhando o Ademar,
levarei também o zezinho
pois na pescada, melhor não há.

Quando foi na quinta-feira,
logo cedo, os pescadores seguiram,
todos em uma carroça
com toda a traia que levava,
levaram alimentos para três dias
e a cachaça não faltava.

O cavalinho choteava
parecia sentir prazer,
mesmo levando peso,
seus passos, eram quase um correr.



A mulher do totônho indagou
o local da pescaria,
o Ademar lhe respondeu:
____Desta vez você vai gostar,
na lagoa tem peixes acumulados
pois ninguém lá vai pescar.

É a lagoa do finado Afonso
do outro lado da passagem
desde que ele morreu
na lagoa, ninguém faz paragem

contam de lá muitas coisas
mas em nenhuma eu acredito ,
só creio no que vejo
e não no que está escrito.

Na hora um vento frio
por todos eles passou ,
não seria um mau presságio
pois nenhum deles ligou.

Seguiram alegre o caminho
que levava rumo à lagoa,
contavam casos e riam muito
tomando uma pinga da boa.

Por volta das nove horas
daquela manhã lá estavam,
acampados na beira das águas
e as primeiras redes armavam.

Logo então alguns peixes
no anzol também saiu,
fartando a mesa do almoço
que alegre Ana serviu.


As crianças brincavam na grama
enfrente ao rancho improvisado,
na lagoa os homens pescavam
esquecidos de um assunto passado

... É que o dono destas terras
há muito que já morreu,
sentindo-se acuado por um caso
que com ele sucedeu.

Não aquentou a vergonha
que este caso causou,
pensou então sua vida
e um plano traçou:

_____ O remorso me coroe
pelo mal que a minha filha fiz,
estraguei a minha vida
e ela nunca mais será feliz
pois em meio a sua adolescência,
sua inocência desfiz.

Findarei a minha vida
pois não mereço mais viver,
peço a Deus que me perdoe
pelo que pretendo fazer...

No outro dia bem cedo
o seu corpo foi achado ,
pendurado a uma corda,
tinha o pescoço quebrado.

Vou pegar lenha, disse Osmar aos amigos
pois a noite vai chegar
vamos fazer uma fogueira
pra todos nós se esquentar.


Já envolta das chamas ardente
aquele grupo se sentou ,
contavam casos e bebiam muito
e do falecido se lembrou.

Como que em resposta ao chamado
uma grande gargalhada se ouviu,
parecia que vinha do mato
outra hora do meio do rio

A mulher então exclamou:
_____ Homem, você ouviu?
esta risada espantosa
que me causou arrepio.

Vocês falam em gente que já morreu
isto não é coisa que se faz,
devemos viver nossos momentos
e deixar os mortos em paz..

Todos fizeram silencio
pensando no que seria,
aquela risada no mato
em uma noite tão fria.

Nisso então o zezinho
já quase bêbado gritou:
_____ Se for gente vem pra cá!
Se és morto, com medo não estou.

Aí então a risada
novamente se ouviu,
vindo em direção ao fogo
causando mais arrepios.




As mulheres agarraram os meninos
e começaram a rezar,
os homens, alto gritaram,
se és defunto, pode voltar.

A risada para de repente
e todos ficam aliviados,
nisso um forte chute na fogueira
joga brasas pra todos os lados.


O susto agora foi tanto
que de costas uns até caíram,
as chamas subiram de repente
e a risada novamente ouviram.

Seu Osmar ficou nervoso
nesta hora ele gritou:
___ Some daqui, branco safado
vai assustar quem te soltou.

A mulher pediu para ir embora
mas os homens estavam irados,
daqui não sairemos, não vamos voltar
sem levarmos os nossos pescados.

Parece que a bronca deu certo
pois na hora tudo acalmou,
não se ouvia nenhum barulho...
mas, o silêncio também assustou.

Todos estavam apreensivos
com medo do que poderia acontecer,
nisso ouviram o relincho do cavalo
que sozinho começou a volver.



_____Veja Osmar, o cara agora tá pegando o cavalo,
o que será que ele vai fazer?
Viram o cavalo, ser arreado a carroça,
sem da assombra poder correr.

O vagabundo está roubando nosso cavalo
vamos logo dele tomar,
mas nesta hora ouviu uma forte risada
e o cavalo começou a marchar.

Correram em direção à lagoa
não deram conta de pegar,
o cavalo entrou nas águas
com a carroça a puxar.

O zezinho gritou em desespero
____ O safado quer matar o cavalo!
Vai atolar a carroça
e o pobre animal morrerá afogado.

Ma a turma abismada viu
da beira da lagoa, o cavalo nadar,
atravessou arrastando a carroça
e do outro lado chegar.

A risada se tornou mais forte
e um vento com ela veio,
um redemoinho se formou no acampamento...
aí, o povo viu o que é feio.

As panelas caíram no chão
por todo o pasto se espalhou,
o rancho foi arrancado,
nem um pau ali ficou.




Todos ficaram pensando
o absurdo que a assombra fez,
Assim que raiou o dia
tiveram então que voltar
não tinham nenhuma comida
e nem peixes para mostrar.

Hoje estando sóbrios e em casa
Nem do caso querem lembrar,
Ficam todos arrepiados
Quando alguém vem perguntar,
Pela pesca na lagoa do Afonso
Lugar assombrado, este é um, pode apostar.


Adilson Silveira
20/03/2005


“Esta estória é mera ficção, qualquer semelhança com pessoas ou fatos da vida real, é mera coincidência”

sexta-feira, 24 de julho de 2009

ACRÓSTICO A UM AMIGO

Abençoado o dia que vieste ao mundo!
Risos eufóricos comemoravam sua chegada.
Instinto a mim revelava, imagem e semelhança de menino Deus.
Seu semblante de anjo,
Isto sempre mostrou ,
Ostento de mansidão, paz e amor.

Era um dos filhos mais desejado.
Ungi-vos ainda em feto,
Seguirás o caminho de Cristo,
Tomaras para Ti responsabilidades,
Andarás sempre nas linhas certas que o Senhor escrever,
Quando o menor lhe procurar
Urgi-se em atender.
Ignore o tempo em seu favor
Onde alguém o chamar, atenda-o com amor.

Conheces o caminho a trilhar,
Obstáculos a serem ultrapassados.
Escolhas sempre o caminho do bem,
Lembra-te dos ensinamentos em ti fundados.
Haja sempre com luz e luz também serás
Orgulho, para os que querem a paz.

Marque sua passagem terrena,
Avance em águas mais profundas,
Ganhe anjos para o Senhor,
Aliviando a dor do mundo.
Levante suas mãos aos céus,
Horas e horas trabalhai,
Ancião serás, como símbolo bíblico,
Espere firme em Mim, seu senhor.
Sempre estarei contigo.

Adilson Silveira
Feliz 2009 – muita saúde e paz

quinta-feira, 23 de julho de 2009

A ASSOMBRA, ASSOMBROU...

Contava meu pai certa vez, de um caso que com ele se passou. . .
____ cheguei na praça todos comentavam do susto que o Juliano levou, olha que este moço não era molenga, tinha até fama de brigador, tomava cachaça e mascava fumo; coisa de matuto rasgadô.
Trabalhava embutido nos matos, usava um machado pesado, de um lado um corte luzente e de outro lado um pontinho agussado.
Desprezava montaria mesmo se o patrão lhe oferecesse, fazia seu trajeto a pé, calçando umas precatas de couro de bichos que ele mesmo cassava. Comentavam todos admirados, como pode um homem tão bravo, chegar assim assustado.
Contava ele que viu, com os olhos que a terra há de comer, duas velas acessas sobre a cruz, pavoroso, credo em cruz, Deus me livre de rever.
Perguntaram a ele onde viu tanto pavor, o homem parecia até gaguejar: foi na virada de estrada, sobre uma cruz que tem lá.
Será que o defunto quer missa, o padre tem que celebrar, alma penada sofre muito e ainda vem nos assombrar, temos que dar um jeito, desta coisa fuguetar.
Quando o Juliano me viu, veio logo me alertar. . . Zé Cândio, Zé Cândio espera, oce tem que me escutar, na curva lá da estrada, eu vi o bicho pegar, foi bem perto da porteira, que dá pras terras do Alagado, sobre aquela cruz de madeira, ao lado da porteira fincado.
O que foi que você viu seu jú, que estão todos a comentar, parece que viu sombração e agora quer também assombrar:
Zé Cândio é o seu caminho, que leva pras terra arrendada, cê passa lá todos os dias, ainda vai encontrar a roubada.
Você cria juízo e para de beber, isto é coisa da marvada, já comeu seus miolos que eram poucos, agora até a visão ta embaralhada.
Vai gozando de mim, vai, vai. Se um dia lhe acontecer, quero ver você voltar, do meio do caminho para esta estória contar, vou dar tanta gargalhada que até meus bofes vão se soltar.
Não estou nem um pouco assustado, com estas coisas eu não brinco, não abuso de quem já foi, mas aposto com quem quiser, quando marco meu caminho, vou até o fim, e dele não arredo o pé.
Passaram então alguns dias, numa tarde, eu tinha de voltar pro roçado, arrumei minha matula, a mula já estava amarrada, depois das crianças dormirem, atravessei o povoado.
Chegando então numa curva, perto da porteira dos alagados, eu vi uma coisa estranha, acima do chão parado.
Lembrei logo do Juliano, no grande susto que tomou, a mula deu um corcovo, mas nem isto me assustou.
Firmei encima dos arreios, logo a chibata estralou, minha mula estribava, e nervoso me deixou.
Animal que eu montar é que tem de me obedecer, cravei as esporas na bicha, senti ela encolher, saiu pulando que nem doida, mas nas rédeas tinha que me obedecer.
Chegando mais perto eu vi, parecia mesmo duas velas acessas, a mula não queria passar, gritei então com clareza.
Sai de meu caminho coisa tinhosa, não vê que quero passar, não arredo um passo da porteira, é você que vai se afastar.
Esperei um minutinho, foi como se um ano passou, as velas continuavam acessas, parecia até que o fogo aumentou.
O jeito foi dar no trinta, na hora a mula empinou, atrapalhou minha mira, os dois tiros não pegou, nisso a coruja bateu asas, deu um pio e vou.
Acabou-se a assombra das velas acessas, ninguém mais se preocupou, com a luz dos olhos da coruja, que para o sertão, voou, voou, voou...


Adilson Silveira
Janeiro de 2009

JUVENTUDE INTERROMPIDA

Não meu filho, é melhor você não ir.
Assim dizia a mãe tentando convencer o filho a não ir a uma festa religiosa, em uma comunidade ali próxima.
O tempo ta muito frio... e este povo não tem horário para voltar. É melhor você ficar com a mamãe.
Mas o menino empolgado com o convite do irmão, o mais velho da casa e sabendo que outros colegas seu irão, insiste com sua mãe que não se importava com o frio, queria mesmo ir.
A condução para no pátio da igreja, eufóricos todos descem e aquele jovem observa a paisagem ao redor. Fica vislumbrado com o lugar que abriga a pequena igrejinha erguida em louvor a Nossa Senhora. Firmando a vista mais longe percorre os cerrados percebendo pés de pequis, araticuns e em meio a arrueiras a vegetação do cerrado. Em frente a igreja uma área bastante grande exibia uma grama comum, muito verde, que se contrastava com o branco da capela, enquanto a seu lado, um estaleiro equilibrava um sino de bronze na ponta de uma corrente mascada pela corrosão do tempo. Olha mais em volta e vislumbra-se com as luzes da barraquinha, onde uma estrutura bem típica da roça, mostra vários conjuntos de mesas com cadeiras alinhadas, prontas para receberem as pessoas que nesta hora estavam no interior da igrejinha, assistindo a santa missa. No pátio perto da barraquinha, inúmeros carros, motos e até mesmo três charretes de alguns sitiantes ali de perto. O menino se caminha para a igreja, mas não entra, fica parado recostado ao portal de onde deu uma rápida olhada no interior da singela casa de Deus. Logo voltava sua atenção para o movimento no interior da barraquinha. A noite se aproxima rápida e junto com ela um barrado avermelhado na linha do horizonte, o faz lembrar de sua casa, quando da varanda, observava o dia se acabando com este mesmo efeito, ouvia sempre sua mãe dizer: entra e feche a casa que esta noite vai ser muito fria. Acaba-se a missa, e como num passo de mágica, em poucos minutos os lugares da barraquinha são ocupados pelos freqüentadores do culto ali celebrado. O som ligado alto, fazia as pessoas conversarem sempre próximas ao ouvido das outras. O adolescente caminhava em torno da festa, vislumbrado com a alegria que emanava daquela gente simples, ali presentes em busca de diversão. O barulho de mais carros e motos chegando o faz perceber que o negro da noite agora queria ocupar todo o espaço que antes a luz do dia cobria, respeitava somente as luzes da barraquinha, que as vezes pareciam até piscarem embaladas pela potencia do som que animava a festa. Aonde parecia não caber mais ninguém, a cada instante se enchia mais e mais, pois a luz de motos e carros chegando, riscavam a escuridão da noite vindo em direção à festa. Horas alegres passam, agora pouco a pouco as famílias se levantam, despedem muito alegres e seguem para seus carros, felizes com a harmonia daquela noite. Percebe que os motoqueiros não param de chegar, agora porem estes que chegam, imbicam suas motos quase dentro da barraquinha e antes de as desligarem, aceleram forte, mostrando a potencia em que estão montados. Adentram a barraquinha conversando sempre entre si, parecem não verem as pessoas que ali ocupam o mesmo espaço. Suas atitudes são de animais enlouquecidos, não se acomodam em nenhum lugar, sempre inquietos e conversando o mais alto que podem, chegam a incomodar outras pessoas, que mudam de lugares ou se levantam e vão embora.
Um alvoroço se forma pelos lados dos banheiros, alguém grita: é briga, é briga...
A musica alta encobre a confusão, e aparentemente tudo se acalma. Quando ninguém mais se preocupa, o disparo de um revolver rompe a barreira da musica, enquanto gritos de horrores quebram a harmonia do lugar. Por instinto todos se levantam empurrando mesas e cadeiras, o desespero aumenta ao se ouvir mais dois tiros. Olhos incrédulos se estarrecem ao ver o corpo caído na linha perimétrica da barraca, o barulho de uma moto em retirada deixa um cheiro forte de poeira no ar. Aquela noite escura e fria, jamais será esquecida. Enquanto mãos amigas acodem o infeliz, o sangue já banhava a terra, marcando tragicamente aquela noite festiva. Vozes pesarosas exclamavam: meu Deus, ele é apenas uma criança... petrificado, o irmão mais velho só conseguia chorar, enquanto pensava: como contar para minha mãe que mataram meu irmãozinho.
Mas a noticia rasga o frio da noite e chega à sua mãe... seu sofrimento é tanto que roubou minha capacidade de descreve-lo nesta crônica.
A dor da mãe, também ainda doe em mim ...


Adilson Silveira-
- Julho de 2009-

PEDRO GATO - CONTO

Em um cantinho do sertão, onde a lei não havia chegado, formou-se um vilarejo a muitas léguas da cidade. Chamada de Pedro Gato, (Vila do Pedro Gato), vilarejo ao pé da serra, escondida no meio do mato. É terra de gente valente, povo que medo de nada tem, vivem numa certa harmonia, ariscos, provoca-los não convém.

Um tal de Pedro mudou pra lá, casinha simples, quase no centro do povoado, homem de cor escura, mulato ao sol torrado. O caboclo tinha dois filhos, o mais velho era rapaz já feito, muito educado e trabalhador, nele não era achado defeito.

O mais moço era gazeteiro, de tudo dava noticia, e certa vez, por falar demais, prometeram fazer de seu couro, cortiça. Senhor Pedro para intimidar os inimigos do filho seu, um aviso mandou rolar, “fala aí a estes garotos, que querem em meu filho tocar, sou da paz, mas não sou veludo, viro leão se me acuar, por meus filhos dou a vida, não me tente, posso estourar”. Cutucar onça com varra curta é suicídio, cuidado, o bicho vai pegar.
Na entrada da casa do senhor Pedro, um jardim de folhagens ornamentavam o espaço, protegidos por um estacado de aroeiras, muitas flores penduradas aos cachos. Tinha uma cancela de pau, cravada em um esteio bem alto, no seu tôpo um sino de bronze, por uma corrente amarado, era para espantar os coiotes que vinha por estes lados.

Para dar sinal de alerta o sino também servia, tocavam-no na hora do almoço e também na Ave- Maria. Porem virou ponto de mira para o revolver de senhor Pedro, que sentado na mureta da varanda, disparava com certeza, a bala resvalava no bronze mostrando sua proeza.

Logo a noticia correu “Seu Pedro está trinando, certamente para matar, a quem tocar em seu filho, este é o rosnado que o leão dá”.
Assim virou mania, atirar no sino só pra ver o seu cantar, tinia retumbando na noite, logo alguém começava a comentar, “isto é tiro de Seu Pedro treinando para matar”.
Os rapazes acovardaram da briga, logo a paz voltou a reinar, Seu Pedro guardou um segredo, que só muito velhinho contou, “dos tiros que dei no sino, nem todos acertaram, mas o tinido do sino sempre se ouvia, vou contar como ocorria, resultado de um plano que bolei na manhã de certo dia, para respeito impor, e livrar desta ingrisia”.

Cada tiro que disparava a noite no sino, era difícil de acertar, mandava meu filho bater-lhe com pau na hora que eu disparar. O sino tinia na noite, fazendo todas acreditar, que eu era mesmo valente, disposto até mesmo a matar.

Assim só três conheciam o segredo, eu, meu filho e o sino... este é metal, não pode me falar.

Adilson Silveira
fevereiro/2009